Quando a Oferta se Torna uma Transação com Deus
Primeira Leitura: Eclesiástico 35,2-15
Salmo Responsorial: Sl 49(50),5-8.14.23
Evangelho: Marcos 10,28-31
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Muitas pessoas tratam a fé como um negócio – ofertam a Deus esperando receber algo em troca. Seja ao colocar dinheiro no cesto da coleta, jejuar ou praticar a caridade, muitas vezes há uma expectativa oculta: Se eu fizer isso, Deus me abençoará mais. Mas será que Deus realmente age assim? Essa mentalidade transacional está profundamente enraizada em muitas práticas religiosas, onde a fidelidade é medida pelo quanto alguém pode “investir” em Deus para obter um retorno garantido. Isso explica por que algumas pessoas doam milhões durante um chamado “momento profético”, mas hesitam quando a Igreja ou alguém próximo está passando por uma necessidade urgente. A motivação é diferente: uma é vista como um negócio espiritual lucrativo, a outra como simples generosidade, sem um retorno imediato. Essa prática tem se tornado cada vez mais comum em países como a Nigéria e em várias partes do mundo, onde o Cristianismo se mistura com o materialismo. Muitos correm para lugares onde acreditam que seu dinheiro será “abençoado” ou multiplicado através de uma profecia, em vez de darem por amor genuíno a Deus. Um homem pode plantar uma “semente poderosa” em busca de uma grande virada financeira em um evento religioso, mas se recusa a ajudar um orfanato ou um hospital necessitado. A crença subjacente não é uma fé verdadeira, mas um tipo de aposta espiritual – uma loteria divina, onde se espera o grande prêmio.
A Primeira Leitura (Eclesiástico 35,2-15) confronta diretamente essa visão corrompida do sacrifício. O texto enfatiza que Deus não é um comerciante que espera o maior lance, mas um juiz justo, que valoriza a obediência, a justiça e o culto sincero. Ele ensina que seguir os mandamentos, agir com integridade e ajudar os pobres valem muito mais do que sacrifícios materiais. A leitura afirma: “O Senhor é aquele que retribui e ele te devolverá em dobro”, mas isso não significa que a recompensa divina segue uma fórmula rígida de investimento e lucro. O Eclesiástico esclarece que o tipo de sacrifício que Deus aceita vem da retidão do coração, não da manipulação. Diferente da mentalidade da teologia da prosperidade, que muitos têm adotado, o verdadeiro sacrifício é um ato de amor e devoção, não um meio de “pressionar” Deus a agir.
O Salmo Responsorial (Sl 50) reforça esse ensinamento ao desmontar a ilusão de que Deus precisa das nossas ofertas. “Não te repreendo pelos teus sacrifícios… Pois são meus todos os animais da floresta.” Se Deus já é o dono de tudo, que valor têm nosso dinheiro, jejum ou oferta? A resposta está no final do salmo: “Oferece a Deus um sacrifício de louvor.” Deus não se impressiona com quantias ou gestos externos, mas olha para a intenção do coração. Quem dá apenas esperando retorno pode até alcançar prosperidade temporária, mas perde a verdadeira bênção: a comunhão profunda com Deus. O salmo nos alerta que uma fé sem autenticidade transforma o culto a Deus em um ritual vazio e sem sentido.
O Evangelho (Marcos 10,28-31) expõe ainda mais a realidade do verdadeiro sacrifício. Pedro lembra a Jesus que os discípulos deixaram tudo para segui-lo. Em resposta, Jesus garante que aqueles que sacrificam por causa do Reino receberão bênçãos nesta vida e na vida eterna. No entanto, Ele insere uma verdade difícil: “com perseguições.” É aqui que muitos que enxergam a fé como um contrato com Deus se perdem. A expectativa é que o sacrifício leve a uma vida fácil e cheia de recompensas materiais, mas Jesus avisa que o discipulado autêntico envolve sofrimento. Aqueles que verdadeiramente entregam suas vidas a Deus podem não ver sucesso imediato, mas são assegurados de algo muito maior: a vida eterna. A última afirmação de Jesus, “Muitos que agora são os primeiros serão os últimos, e os últimos serão os primeiros,” é um golpe direto contra aqueles que tentam comprar o favor divino. Os que fazem alarde de suas ofertas para serem vistos pelos outros podem acabar espiritualmente falidos no fim, enquanto aqueles que servem a Deus de maneira sincera e discreta receberão a maior recompensa.
Essas leituras trazem lições fundamentais para a nossa vida. A fé nunca deve ser reduzida a um esquema de investimento espiritual. Muitos tratam Deus como um caixa eletrônico divino – depositam orações, dinheiro e jejuns, esperando saques garantidos de riquezas e sucessos. Mas essa não é a fé cristã verdadeira. O perigo dessa mentalidade é que, quando as bênçãos esperadas não chegam, a fé se dissolve. Quantas pessoas já se afastaram de Deus porque a “semente” que plantaram não trouxe o retorno financeiro que esperavam? A verdadeira fé não exige resultados imediatos; ela confia na vontade de Deus, quer Ele conceda ou retenha suas bênçãos.
Queridos irmãos e irmãs em Cristo, essa reflexão nos convida a examinar nossas intenções ao dar. Servimos a Deus por amor ou secretamente esperamos algo em troca? Estamos mais dispostos a ofertar quando há uma promessa profética imediata, mas relutantes quando a Igreja ou os necessitados precisam de ajuda? O verdadeiro sacrifício é sem condições – uma entrega do coração, e não apenas da carteira. Quem compreende isso não mede a fé por bênçãos materiais, mas por um relacionamento profundo com Deus, mesmo quando isso exige sofrimento.
Oxalá ouvísseis hoje a sua VOZ: não fecheis os vossos corações! (Sl 95,7)
Shalom!
© Pe. Chinaka Justin Mbaeri, OSJ
Seminário Padre Pedro Magnone, São Paulo, Brasil.
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